*Dra. Kátia Schenato Valandro
A maioria das pessoas acredita que o procedimento de um inventário, seja ele de forma judicial ou extrajudicial, é oneroso.
Assim, sempre que possível, buscam formas de fugir dele ou evitá-lo, ou, ainda, de reduzir o valor do imposto incidente na transmissão que tem por causa a morte de alguém.
Contudo, embora haja, efetivamente, algumas formas de se buscar reduzir ou mesmo evitar a incidência de tributos, o fato é que cuidados são recomendados (fortemente).
Uma das situações em que é possível evitar que ocorra o imposto de transmissão em razão do falecimento de alguém é a chamada renúncia.
No entanto, antes de conversarmos sobre ela, é necessário trazer ao leitor que o imposto que incide na transmissão da propriedade de um bem para os herdeiros do falecido acontece sempre que os herdeiros aceitarem a herança, ou seja, a receberem.
A alíquota varia de Estado para Estado, mas em todos há a incidência.
Assim, a primeira premissa da nossa conversa é que o herdeiro pode tanto aceitar quanto renunciar a herança.
Ao aceitá-la, incidirá no fato gerador do tributo que denominamos ITCD – imposto sobre a transmissão causa mortis e doação de quaisquer bens ou direitos.
Ao renunciá-la, fará com que o fato gerador não ocorra, motivo pelo qual não há a incidência do imposto de transmissão.
Entendida essa premissa, continuamos o nosso caminho.
Frequentemente ouvimos que as pessoas querem renunciar a herança em favor de algum outro herdeiro ou pessoa determinada. Por exemplo: um filho quer “renunciar a herança em favor de sua mãe”.
Contudo, não existe, no direito brasileiro, esta figura. Quem renuncia renuncia e pronto. Não renúncia em favor de alguém.
Quando queremos beneficiar alguém com a nossa parte da herança devemos primeiro aceitá-la (o que fará incidir o fato gerador do imposto) e, após, cedê-la, de forma gratuita ou não, ao terceiro indicado (o que fará incidir outro fato gerador de imposto).
Há, nesta situação, a incidência de dois impostos.
Dito isso, o leitor pode se questionar: “se eu não posso renunciar em favor de alguém, de que vale a renúncia?”
Ela vale e é eficaz para casos muito específicos e pontuais.
Isso porque, quando alguém renuncia, dizemos que renuncia ao ‘monte-mor’ ou seja, ao conjunto de bens que pertenciam ao falecido.
Para facilitar, tomemos como exemplo a seguinte situação: o pai, casado pelo regime de comunhão universal de bens, falece, deixando duas filhas, a esposa e uma neta.
Por lei, metade dos bens é da viúva, e a outra metade deverá ser dividida entre as duas filhas.
Estas filhas, na intenção de deixar o patrimônio todo em nome da mãe, decidem renunciar à herança que lhes caberia, pensando que a mãe (viúva) ficará com tudo.
No entanto, quando as filhas renunciam, dizemos que a classe seguinte, que é a dos netos, receberá a herança, caso assim queira.
Ou seja, no nosso exemplo, para que a intenção seja realizada – isto é, todo o patrimônio fique com a viúva, a neta também deverá renunciar.
Neste ponto, o leitor concluirá que a situação estará resolvida, já que basta as filhas e a neta renunciarem para que o patrimônio fique para a viúva.
Em termos.
Isso porque, acaso, anos depois, apareça algum filho até então desconhecido do falecido, reivindicando teste de paternidade, a filiação e sua parte na herança, este filho, sendo reconhecido como tal, herdará toda a herança.
Isso mesmo: toda a herança, porque as irmãs (filhas do falecido) renunciaram, anos antes, ao seu quinhão; e a renúncia é irrevogável.
E, quando renunciamos, é como se não existíssemos. A herança será partilhada, nos termos da lei, com os demais herdeiros.
Assim, no nosso exemplo, se somente um filho, ou dois, de um total de três, renunciam, a herança não vai para a viúva, e sim para o filho que não renunciou.
Complexo, não? E, ao mesmo tempo, arriscado. Isso porque a possibilidade de renunciar atrai as pessoas em razão da não incidência de imposto, mas deve ser muito bem pensada, estudada e estruturada, para que, no futuro, não crie problemas maiores do que aqueles que visou evitar.
Portanto, havendo riscos, a recomendação é que se evite a renúncia e se procure outras formas de planejamento sucessório.
Isso porque, como se viu acima, são necessários alguns cuidados quando as partes decidirem pela renúncia, sob pena de (imensos) prejuízos.
Recomenda-se, por isso, que você procure um profissional de sua confiança para auxiliá-lo neste tipo de situação, esclarecendo dúvidas e, quando possível, sugerindo a melhor alternativa para o caso.
*Advogada. Especialista em Direito Previdenciário e em Direito dos Negócios. Sócia da Bianchi Advocacia.