07 dez

A (IN)COMUNICABILIDADE DA PREVIDÊNCIA PRIVADA NO DIVÓRCIO À LUZ DO RECENTE POSICIONAMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Postado por admin Em Artigos

*Dra. Kátia Schenato Valandro

 

Os doutrinadores e os julgadores pátrios sempre discutiram a comunicabilidade, ou não, dos valores existentes em planos de previdência privada, quando da partilha de bens de um casal.

Há julgados no sentido de que os valores depositados em previdência privada não se comunicam, isto é, não devem ser partilhados, quando da separação do casal, pois se tratam, na verdade, de seguro previdenciário adicional, visando assegurar renda futura.

Contudo, há entendimentos contrários, determinando a partilha. Quem defende tal interpretação traz como fundamento o fato de o plano de previdência se tratar de um investimento, e não uma complementação previdenciária.

A divergência remonta ao tipo de previdência privada; isso porque há dois formatos institucionalizados de planos: o aberto e o fechado.

A previdência privada “aberta” refere-se a planos comercializados por bancos e seguradoras, e que podem ser adquiridos por qualquer pessoa física ou jurídica. O órgão do governo que fiscaliza e dita as regras dos planos de Previdência Privada é a Susep (Superintendência de Seguros Privados).

Já a previdência privada “fechada”, também conhecida como fundos de pensão, refere-se a planos criados por empresas e voltados exclusivamente aos seus funcionários, não podendo ser comercializados para quem não é funcionário daquela empresa. A Superintendência Nacional de Previdência Complementar (PREVIC) é a autarquia responsável por fiscalizar as atividades das entidades fechadas de previdência complementar (fundos de pensão).

Assim, a controvérsia quanto ao tema de partilha dos valores referentes aos planos de previdência privada deve-se ao fato de existir diferentes modalidades destes, entre os quais aqueles de contratação livre por qualquer pessoa (aberta), que podem se confundir como um tipo de investimento, e não uma complementação previdenciária.

Embora haja características em alguns planos de previdência que se assemelham a planos de investimentos, alguns Tribunais entendem que é da natureza desses produtos a complementação de renda. Devido a isso, os valores devem ser preservados da comunicação patrimonial, pela perspectiva personalíssima de assegurar renda futura. Ou seja, não entram na partilha de bens do casal.

No entanto, recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), de setembro deste ano, ao julgar o Recurso Especial nº 1.698.774, firmou tese, por unanimidade, no sentido de considerar comunicáveis valores recolhidos pelo cônjuge a título de previdência complementar privada, no regime da comunhão parcial (e, portanto, extensível também à comunhão universal), por ocasião da partilha em divórcio, integrando a meação do outro cônjuge.

Os Ministros que compõem a 3ª Turma do Tribunal Superior consideraram que a previdência privada, na modalidade “aberta”, não estaria enquadrada na hipótese de incomunicabilidade prevista na Lei Civil, *por ter natureza de mero investimento*, equivalente a rendimentos de capital ou outras operações de lucro financeiro.

Consta na ementa da decisão colegiada:

_Os planos de previdência privada aberta, operados por seguradoras autorizadas pela SUSEP, podem ser objeto de contratação por qualquer pessoa física e jurídica, tratando-se de regime de capitalização no qual cabe ao investidor, com amplíssima liberdade e flexibilidade, deliberar sobre os valores de contribuição, depósitos adicionais, resgates antecipados ou parceladamente até o fim da vida, razão pela qual a sua natureza jurídica ora se assemelha a um seguro previdenciário adicional, ora se assemelha a um investimento ou aplicação financeira._

_Considerando que os planos de previdência privada aberta, de que são exemplos o VGBL e o PGBL, não apresentam os mesmos entraves de natureza financeira e atuarial que são verificados nos planos de previdência fechada, a eles não se aplicam os óbices à partilha por ocasião da dissolução do vínculo conjugal apontados […]._

Em seu voto, a relatora do Recurso Especial, Ministra Nancy Andrighi, fez referência à divisão existente na doutrina e jurisprudência sobre a matéria apreciada:

Diante dessas feições muito próprias, a comunicabilidade e partilha de valor aportado em previdência privada aberta, cuja natureza jurídica ora se assemelha a um seguro previdenciário adicional, ora se assemelha a um investimento ou aplicação financeira, é objeto de profunda divergência doutrinária.

O recente posicionamento do Tribunal Superior apenas corrobora que a matéria é controvertida. Tal discussão, no entanto, infelizmente, não se esgotará no precedente citado, ainda que esta decisão seja um sinal do direcionamento interpretativo do órgão colegiado.

Urge que o entendimento seja consolidado nos Tribunais Pátrios a fim de trazer segurança jurídica às partes contratantes.

Tendo em vista a complexidade do assunto e a controvérsia instaurada, sugere-se que as partes atingidas procurem profissional de sua confiança para auxilia-las, esclarecendo dúvidas e solucionando eventuais discussões e problemas.

 

*Advogada. Especialista em Direito Previdenciário e em Direito dos Negócios. Sócia da Bianchi Advocacia.


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