16 ago

AS CONTRIBUIÇÕES AO INSS ABAIXO DO MÍNIMO: CUIDADOS QUE DEVEM SER ADOTADOS

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*Dra. Kátia Schenato Valandro

A reforma da Previdência parece assunto do passado; afinal, entrou em vigor em novembro de 2019, há quase dois anos.

Contudo, seus efeitos continuam sendo (e serão) sentidos (ou seria melhor dizer, serão ‘sofridos’), ao longo das próximas décadas.

Normas, memorandos e normativas internas continuam sendo expedidas pelo órgão previdenciário visando adequar a ‘sua’ visão e interpretação a respeito da reforma proposta pelo governo e aprovada pelo legislativo.

Uma das novidades trazidas com o texto constitucional diz respeito às contribuições pagas ao INSS abaixo do salário mínimo.

A EC103/2019 acrescentou o parágrafo 4º, ao artigo 195, da Constituição Federal, que dispõe que “_o segurado somente terá reconhecida como tempo de contribuição ao Regime Geral de Previdência Social a competência cuja contribuição seja igual ou superior à contribuição mínima mensal exigida para sua categoria, assegurado o agrupamento de contribuições_”.

No artigo 29, a citada emenda constitucional traz, além do agrupamento de contribuições, as possibilidades de complementação e utilização de salários de contribuição:

Art. 29. Até que entre em vigor lei que disponha sobre o § 14 do art. 195 da Constituição Federal, o segurado que, no somatório de remunerações auferidas no período de 1 (um) mês, receber remuneração inferior ao limite mínimo mensal do salário de contribuição poderá:

I – complementar a sua contribuição, de forma a alcançar o limite mínimo exigido;

II – utilizar o valor da contribuição que exceder o limite mínimo de contribuição de uma competência em outra; ou

III – agrupar contribuições inferiores ao limite mínimo de diferentes competências, para aproveitamento em contribuições mínimas mensais.

Parágrafo único. Os ajustes de complementação ou agrupamento de contribuições previstos nos incisos I, II e III do caput somente poderão ser feitos ao longo do mesmo ano civil.

Na prática, isso significa dizer que os meses em que o segurado contribuir abaixo do salário mínimo, referido mês não (repita-se, não) será computado para fins de tempo de contribuição.

Posteriormente, com a edição do Decreto 10.410, de 30 de julho de 2020, o INSS restringiu ainda mais os efeitos das contribuições pagas abaixo do mínimo, asseverando que aquelas não serviram para manutenção da qualidade de segurado, carência e tempo de contribuição.

Isto é, “_ a partir de 13/11/2019, para fins de aquisição e manutenção da qualidade de segurado, de carência, de tempo de contribuição exigidos para o reconhecimento do direito aos benefícios do regime geral e para fins de contagem recíproca, somente serão consideradas as competências cujo salário de contribuição seja igual ou superior ao limite mínimo mensal do salário de contribuição_” (redação do artigo 19-E).

Neste ponto, cabe consignar que a administração pública, por meio de simples decreto, alargou o espectro da norma, prejudicando direitos sociais, o que, espera-se, não encontrará amparo no Poder Judiciário.

Cabe consignar que anteriormente a reforma, o contribuinte individual já era obrigado a complementar as contribuições abaixo do salário mínimo. No entanto, tal exigência não era feita ao segurado empregado, ou ao trabalhador intermitente, por exemplo.

No entanto, após 13 de novembro de 2019, tal situação está sendo exigida também destes últimos.

Assim, é de extrema importância se atentar para as contribuições realizadas pelos segurados, abaixo do salário mínimo.

Quando isso ocorrer, há três situações possíveis:

(i) complementar a contribuição daquelas competências, de forma a alcançar o limite mínimo do salário de contribuição exigido naquele mês;

(ii) utilizar o excedente do salário de contribuição superior ao limite mínimo de uma competência para completar o salário de contribuição de outra competência até atingir o limite mínimo;

(iii) agrupar os salários de contribuição inferiores ao limite mínimo de diferentes competências para aproveitamento em uma ou mais competências até que estas atinjam o limite mínimo.

Estes ajustes de (i) complementação, (ii) utilização e (iii) agrupamento poderão ser efetivados, a qualquer tempo, por iniciativa do segurado, hipótese em que se tornarão irreversíveis e irrenunciáveis após processados.

A (i) complementação poderá ser recolhida até o dia quinze do mês subsequente ao da prestação do serviço e, a partir dessa data, com os acréscimos previstos no art. 35 da Lei nº 8.212, de 1991.

O procedimento de complementação está previsto na Portaria 203, da Diretoria de Benefícios do INSS, que determina que a complementação deverá ser realizada através do Documento de Arrecadação de Receitas Federais – DARF, com a utilização do número do CPF do segurado/contribuinte, no código de receita 1872 – Complemento de Contribuição Previdenciária, conforme Ato Declaratório Executivo CODAC/RFB nº 05, de 06/02/2020.

Para o empregado, o empregado doméstico e o trabalhador avulso, a complementação será efetuada por meio da aplicação da alíquota de sete inteiros e cinco décimos por cento (7,5%).

Para o contribuinte individual que preste serviço a empresa, e que contribua exclusivamente nessa condição, a complementação será efetuada por meio da aplicação da alíquota de vinte por cento (20%).

Os ajustes referentes à (ii) utilização e ao (iii) agrupamento serão efetuados na forma indicada ou autorizada pelo segurado, desde que utilizadas as competências do mesmo ano civil.

De se ressaltar que há doutrinadores que levantam vozes tanto contra o agravamento da restrição feita pelo Decreto 10.410/20, quanto contra a redação do próprio artigo 29, trazido pela EC 103/19.

Isso porque a redação do artigo 28, §§ 1º, 3º e 4º, da Lei de Custeio (Lei 8.212/91), já dispunha que

Art. 28 […]

1º Quando a admissão, a dispensa, o afastamento ou a falta do empregado ocorrer no curso do mês, o salário-de-contribuição será proporcional ao número de dias de trabalho efetivo, na forma estabelecida em regulamento.

[…]

3º O limite mínimo do salário-de-contribuição corresponde ao piso salarial, legal ou normativo, da categoria ou, inexistindo este, ao salário mínimo, tomado no seu valor mensal, diário ou horário, conforme o ajustado e o tempo de trabalho efetivo durante o mês.

4º O limite mínimo do salário-de-contribuição do menor aprendiz corresponde à sua remuneração mínima definida em lei.

Assim, “_considerando que os pisos salariais, legais ou normativos, não podem ser inferiores ao salário mínimo, pode-se concluir que para os empregados, empregados domésticos e trabalhadores avulsos, a remuneração mínima será um salário mínimo, proporcional à quantidade de horas ou dias laborados no mês. Considere-se um empregado contratado para trabalhar apenas meio período por dia; sua remuneração mínima, obviamente, será meio-salário mínimo_”, nas palavras do professor Emerson Lemes.

Continua o professor: “_Vê-se que, até a publicação da EC nº 103/19, não havia previsão constitucional sobre contribuição mínima. Pretendeu o constituinte reformador incluir tal condição no texto da Constituição (ao incluir o § 14 no artigo 195 da Carta Magna) e já prever, no texto da referida Emenda, condições para que o segurado atenda ao requisito constitucional estabelecido. Porém, em nenhum momento o texto faz qualquer referência ao salário mínimo. A Constituição trata, unicamente, de “contribuição mínima mensal exigida para sua categoria_”.

Vê-se, pois, que o tema é novo, controvertido, e levanta vozes a favor e contra as normas legais; e, justamente por ser novo, certamente será objeto de definição no Poder Judiciário.

De igual forma, sendo a matéria complexa e nova, a análise de cada caso, individualmente, mostra-se imprescindível.

Caso você tenha ficado com algum questionamento, sugere-se que procure profissional de sua confiança para auxiliá-lo, esclarecendo dúvidas e solucionando eventuais discussões e problemas.

*Advogada. Especialista em Direito Previdenciário e em Direito dos Negócios. Sócia da Bianchi Advocacia.


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